Pular para o conteúdo principal

Recordações


“Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. E o artigo era bem definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal. Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanático por leituras e filmes ortográficos. O substantivo gostou dessa situação: os dois sozinhos, num lugar sem ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a se insinuar, a perguntar, a conversar.

O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno índice. De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro: ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeça a se movimentar: só que em vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo. Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, bem suave e gostosa.


 Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar. Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto.


Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo seu ditongo crescente: se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula. Ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou outra soletrada em seu apóstrofo.

É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros. Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa. Entre beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objeto, ia tomando conta.

Estavam na posição de primeira e segunda pessoa do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular. Nisso a porta abriu repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história.

Os dois se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou, e mostrou o seu adjunto adnominal. Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo: era um superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos.

Foi chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois. Só que as condições eram estas: enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.
O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história: agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva”.


*Repostando este conto, gosto muito dele. De autor desconhecido ou não. rs

Comentários

  1. Odeio as aulas de gramática na faculdade . rs.
    Uma das poucas aulas do curso de Letras que não gosto.

    ResponderExcluir
  2. Hahaha, achei muito criativo!

    ResponderExcluir
  3. Oiii Tudo bem tem selos para vc lá no meu blog... * Blogueiro de Atitude (Página: Meus Selos) e Escritores virtuas ( Página: Selos)...Adoreii seu blog e estou seguindo...

    ResponderExcluir
  4. AUHSUAHSA. Amo gramática, Pamela. Porém, preciso ser mais fiel para com ela.

    Valeu, Kira. *-*

    Own, obrigada, Aline Cruz. *-*

    Obs: Tentando colocar o blog nos eixos. "Questionários, selos e blogs para visitar" muhahaha

    ResponderExcluir
  5. HUHAUHSUHA. Incrivelmente criativo. Até me fez repensar na minha relação com a Gramática! haha

    :)

    ResponderExcluir
  6. Que bom que o conto foi postado mais uma vez, pelo contrário eu não teria me divertido tanto lendo-o. Adorei mesmo!

    Gostei muito do blog, parabéns por ele ;*

    ResponderExcluir
  7. KKKKKKKKKKKKKKKKK
    Muito interessante, Ari... Ri do começo ao fim.

    Ah, adorei saber que és daqui de Pernambuco (:

    Beijinhos, querida. Bom fim de semana!

    ResponderExcluir
  8. - nossa, que divertido! UEHAUEHUA adorei :)

    ResponderExcluir
  9. SAHSUAHSUAHSU adorei o post *-*
    Arih, tem selinho pra ti no blog.
    Espero que goste. beijo ;*

    ResponderExcluir
  10. Quem disse que o ensino não pode ser divertido. Adorei a aula.

    ResponderExcluir
  11. Olá e ai tudo bem?
    Obrigador por visitar a gente.
    Estamos seguindo.
    Temos novas histórias,mas o do plinio fica pra Terça ok?
    Beijos
    ------------------------
    The Black´s Chaves

    ResponderExcluir
  12. Gostei muito de sua opnião! Forte e consistente!
    Te seguindo!
    beijo

    ResponderExcluir
  13. Muito criativo linda, adoreiiiiii!!!!!!!

    Fico este fragmento:

    "Estavam na posição de primeira e segunda pessoa do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular"

    Adorei, rs

    Bjs

    Mila

    ResponderExcluir
  14. Nossa! Que sacanagem verbal mais ilustrada! rsrsrs
    uma pena não se conhecer o autor desse texto belo...provocativo, mas belo..rsrsrsr


    www.wwfmorales.blogspot.com

    ResponderExcluir
  15. Muito bom!!!
    Que pena que autor desconhecido.
    Quem fez teve a manha total!!!!!
    Vou segui-la.
    Até mais...

    ResponderExcluir
  16. Sensacional! E bastante criativo. rs
    Algo me diz que fora você que o escreveu.

    ResponderExcluir
  17. Poisé, parabéns pelo primeiro lugar, acho INCRÍVEL o jeito que você escreve, mereceu mesmo! e ah, adorei a criatividade do texto, e jeito cômico que foi usado :)

    ResponderExcluir
  18. Demais, adorei! Criativo, inteligente e bem divertido!Parabéns! Abraço

    ResponderExcluir
  19. Show de bola...muito bom mesmo!!! Estou seguindo seu blog!! Abraços!!

    ResponderExcluir
  20. adorei aqui,muito lindo *-*
    adorei esse texto tambem, confesso que eu achei que ia gostar, mais é muito interessante e divertido! Parabéns
    to seguindo, segue tmb?
    http://sentimentosgratuitos.blogspot.com/
    bom fim de semana!

    ResponderExcluir
  21. A criatividade foi muito bom, mas eu não entendi nada (rsrsrs). Coloca o meu blog na sua lista do "Tento Decrifá-los"?


    beijos e fique com Deus

    ResponderExcluir
  22. SUUUGOE! Watashi wa! >u<

    ResponderExcluir
  23. Entendeu nada, Leão? Ah ):
    Leia de novo e deixe sua imaginação fluir, você vai entender e com certeza vai achar engraçado, apesar de ser um 'pouco' erótico. rs

    Ah, tirei minha lista. (:

    ResponderExcluir
  24. Gente adorei seu texto. Achei super criativo e divertido. Muito legal! *--*

    ResponderExcluir
  25. Amei demais esse texto! Super criativo mesmo.

    Beijinhos :*

    ResponderExcluir
  26. Obrigado pela visita, muito legal seu blog, obrigado pela visita,,,,beijos de otima noite.

    ResponderExcluir
  27. Uauau q texto interessante, inteligente, complexo é claro, porém da bvontade de ler direto, de não parar, uma belezura os encontreos consonantais q vc oferece. Amiga sou um gaúcho q adora Recife e Olinda POR EXEMPLO E ADMIRA A BELEZA DA iLHA DE iTAMARACÁ, PRA VC MINHA LINDA BJOS, BJOS E BJOSSSSSSSSSSSS

    ResponderExcluir
  28. Ri MUITO com teu texto e AMEEEEI...
    escreves muito bem.
    beeeijooo

    ResponderExcluir
  29. Eu achei o texto escrito de forma brilhante. Como é bom não encontrar internautês de vez em quando.
    Bom domingo.

    ResponderExcluir
  30. muito criativa e talentosa, adorei '-'

    ResponderExcluir
  31. Muito divertido! Não dei conta da hora que o verbo auxiliar entra em cena...kkkkk

    Abraço querida!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Comente, opine, critique.

Postagens mais visitadas deste blog

Eduardo e Mônica*

Fim de tarde. Ônibus lotado. Legião Urbana. A menina ouvia sua música predileta enquanto lia seu livro predileto, o menino ouvia sua música predileta enquanto segurava sua ânsia de chegar em casa e ligar seu computador para jogar. Ela estava sentada e mergulhava dentro do seu mundo, ele estava em pé e seus dedos inquietos rebatiam o apoio do ônibus.  Sinal verde, sinal amarelo, poff... O ônibus freou e aquele mp3 velho do menino caiu sobre o livro aberto da menina. Os passageiros tentaram se recompor, mas os ouvidos da garota captaram a música daquele mp3 velhinho. O menino se desculpou, ela disse que ele não tinha culpa e sorriu. Ele não tinha jeito para sorrisos e, quando sorriu, ela notou que era verdadeiro.  O velhinho do lado da menina ficou brabo e se levantou para resmungar contra o motorista, ele não tinha nada a ver. Senta do meu lado, convidou a menina. Ela não sentiu vontade de saber tudo sobre ele naquele momento, ela só queria tentar roubar outro sorriso dele. O velhinho

O nome dela é Júlia

Vagalumes Cegos by Cícero on Grooveshark      O cheiro dela sempre estava em mim. Eu, deitado naquela minha rede barata na varanda, escutei suas batidas na porta. Como sabia que era ela? É porque ela batia sem espaço de tempo, como se estivesse fugindo da morte e ali era a salvação. Fui montando o meu sorriso que era dela e chamei de meu dengo.  Encaixei meus dedos nos dela e a puxei ao som de Cícero.   Não, isso não acontecia todos os dias e nem sempre meu humor estava naquela medida, mas esqueci de mim um pouquinho e brinquei com ela.  Dancei com ela durante alguns segundos: aqueles seus olhos fechados, corpo leve e sorriso nascendo. Ainda não disse o nome dela, não foi? O nome dela é Júlia. Júlia de 23 anos, ainda voava como criança e tinha um dom de pintar um quadro mais louco que o outro. Finalmente ela ficou sem fôlego e correu para cozinha. Escutei da sala a geladeira se abrindo e a água sendo colocada num dos copos americanos.

Numa dessas prévias de carnaval

           O dengo dela era farsa. Tudo o que eu descobri foi um sorriso de criança que se apaixonava pelos motivos errados. Amiga dos meus amigos, minha amante nas drogas. Não sei ao certo a idade que ela tinha, mas vendo pelo lado da sua irresponsabilidade e da depressão escondida por trás daquela máscara, eu arrisco uns 20. Morena, uns 1,60 de altura, leve como uma pluma (uns 44 kilos) e olhos que me revelavam tudo e ao mesmo tempo nada. Olhos que me inquietavam. Na verdade, sendo direto a esse ponto, seus olhos eram cor de mel. A encontrei quando estava sendo arrastado por um bloco e ela por outro - e, naquelas ruas do Recife, nos deparamos. Numa dessas prévias de carnaval, ela sorriu com cinismo e me puxou para o clima dela. Me fez dançar toda aquela tarde escaldante, e não cansei. Não cansei de estar perto daquela menina perdida e sem previsão de saída. Ela tinha toda aquela energia que me deixava com vontade de ficar. Uma personagem completamente perdida no mundo das fantas