Pular para o conteúdo principal

A falta de viver.






Céu acinzentado com o leve cheiro da chuva a cair – um beco – nele há uma presença humana sem expectativa de vida. Seus olhos não procuram mais nada, a não ser, um pequeno ponto na parede encardida. Não era menino de rua, suas vestes estavam sujas mais eram belas, não era mulher da vida, sua maquiagem e perfil não eram tão pesados. Era uma mulher. O semblante era triste. Outras pessoas ignoravam sua súplica de socorro, ela gritava por dentro, por alguma ajuda não respondida. Aquele seu sussurro questionava como teria ali chegado, o espírito estava quieto e suas forças esgotadas para um levante. Um encontro. Não, um achado. Um homem a notou e foi até seu encontro. Misterioso. Passos batidos pela pequena poça d’água. Sua presença revelava um estima da sabedoria, olhos negros que buscavam os perdidos. Não houve conversa, apenas um pedido – voltemos ao que chamamos de lar – nada respondeu. Sua paciência parecia se dissipar à medida que a chuva renovava seu ritual. Apenas aqueles dois seres, naquele beco sem saída, e o céu carregado de lágrimas não mais derramadas por aquela mulher, um sussurro de despedida. Permitiu que o homem fosse com suas palavras machucadas e um desespero submetido do seu passado. Permaneceu imóvel, angustiada. Tentou fechar seus olhos para conseguir o equilíbrio, mas estaria muito frágil, até refletir com os olhos fechados doía. Ainda olhava aquele ponto fixo na parede. O único – que para ela – não saíra do seu lado. Escutou o carro saindo em alta velocidade. Um choro. Finalmente se reerguia e voltava ao mundo exterior. Pessoas desconhecidas questionavam sua aparência – apenas aspecto. Caminhava sem vontade de viver e nos olhos a depressão amarga lhe acompanhava. Eu não sou ninguém, mas ainda quero viver. Pediu ajuda. Aquele corpo destruído agora possuía outras vestes, não eram de grife. Seus olhos estavam atentos à rotina da vida e vivos ao que se perdia ao redor. Numa tarde como aquela, céu acinzentado e tempo de frio, encontrou-se com aquele homem que transbordava enigmas em seus passos. Uma surpresa, encontro de olhares. Logo o desencontro de vidas.

- Quer café?

Estava viva. Forte. Não era mais a mesma e ele não mudaria para seguir sua vida - outra mulher ocupava seu espaço perdido – não choraria mais.  Tinha conseguido se libertar da prisão absoluta do seu ego: A falta de viver. Bloqueou seus pensamentos sobre as recordações do passado. A infelicidade que sentia seria o seu motivo para liberdade; seu espírito necessitava de um espaço maior em seu corpo. Não teria asas para voar e mostrar sua independência terna, mas queria ser como o vento e soprar livremente. Ser livre. A chuva ainda caía como daquela tarde.


Curta o blog no Facebook:  Página do Epifania

Comentários

  1. Um conto bem diferente do que costumo escrever, mais tarde eu volto e visito os blogueiros que sempre estão por aqui. Obg, gente.

    ResponderExcluir
  2. Que saudades dos seus contos! Pude sentir a ânsia dessa mulher. Me lembrou muito um conto antigo que você já tinha escrito, apenas adoçou minha saudade, guria. Peguei tantos fragmentos pra mim. Você sempre consegue, não é? Estou lendo algumas eppifanias antigas que não pude ler antes, me identifico sempre.
    boa madrugs.

    ResponderExcluir
  3. Adoro seus contos!!! "Primos" está entre os meus favoritos.

    ResponderExcluir
  4. e esta busca em ser, norteado pela alegria e tristeza, que nos faz humanos. Bjos.

    ResponderExcluir
  5. Um belo conto, mais uma vez vc com suas delicias para quem vem visitar seu cantinho, pra vc minha linda bjos, bjos e bjossssssssssssss

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Comente, opine, critique.

Postagens mais visitadas deste blog

A garota da balada

Tenho pouco tempo para escrever tudo aquilo que eu vi hoje. Estou dentro de um banheiro de uma balada qualquer. Baladas dessas madrugadas que acabam acontecendo quando você está com os amigos e decidem extravasar. Ok. Tenho que dizer que ela é de estatura baixa, cabelos curtos e da cor preta, olhos moldados por um traço marcante e com lábios, exageradamente, lindos. Ester. Este é o nome fictício que inventei para ela e que agora não sai da minha cabeça. Ester dança como uma profissional, mas que ainda consegue ter a proeza de um gingado de menina. A enxergava em câmera lenta e os jogos de luzes a transformavam uma estrela de sucesso no palco. Ester. Ester. Tinha conseguido chegar perto dela. Cheguei dançando no ritmo do barulho e conseguindo conquistar seus olhos sobre mim. E, por eternos cinco segundos, nos olhamos como um caçador olha sua presa e sabe em qual momento deve atacar. Eu estava sendo a sua presa, ela estava me atacando. Ester ria através de cada movimento, olhares,...

A nossa história.

(  Acompanhe :   Prólogo   -   Capítulo I  -   Capítulo II ) O ENCONTRO . Naquele dia, ela acordou com uma vontade enorme de sentir-se amada. Estava cansada do lado da cama vazia e não ter ninguém para beijar no dia 12 de junho. Então, ela se arrumou como nunca antes. Escolheu seu melhor vestido, provocou no seu batom e caprichou no olhar, escolheu aquele salto que valorizava suas pernas e soltou os cabelos. Quando se olhou no espelho, se auto admirou. Que tipo de princesa a donzela teria se transformado? Sairia feliz e convicta que estava armada como um cupido do amor. Ela queria um parceiro que a dissesse que a amava e que a queria por toda vida. Passou por tantos pretendentes, mas nenhum a fazia sentir aquele toque de entusiasmo  (borboletas voando dentro da barriga) dentro do coração. Ele, o coração, palpitava cheio de energia quando um suposto príncipe a olhava e chamava para beber, mas no fundo tudo seria passageiro. Ela queria um que dura...

O quanto é bom amar devagarzinho

Hoje abri a janela com um sorriso no rosto. Você estava deitado em minha cama com um ar de satisfeito-preguiçoso-cafajeste-na falta de um abraço. Eu estava naqueles dias em que tudo é sorriso, tudo é motivo de relembrar os bons momentos do passado e o melhor momento para planejar o futuro. Sentia uma energia tão vibrante dentro de mim que desejava explodir e acender todo o nosso quarto. Misturar a minha energia com a sua. Uma sensação de encaixe. Como se agora eu pudesse ver a figura secreta do quebra-cabeça. Alisei o seu rosto. É engraçado nos questionarmos nessas horas o porquê da demora de encontrar quem nos faz tão bem. Considero essa felicidade como a linha de chegada. Aquela mesma sensação de ter ganho algo que você lutou por tanto tempo e que agora finalmente você pode gritar para todo mundo ouvir o quanto está orgulhoso de si mesmo. O quanto a espera é importante para alcançar algo. Solucionar uma equação perdida entre tantos cálculos, transformar em vírgula aquele ponto deslo...